terça-feira, 27 de março de 2007

Grandes Portugueses, Salazar, Jung e outras divagações de gosto duvidoso de quem até nem fumou nada...

Já muito se escreveu sobre a vitória de Salazar no concurso dos grandes portugueses. E eu nem queria abordar o assunto pois, por um lado, não gosto de chover no molhado e, por outro, acho concursos como esse uma chachada. Independentemente do método de votação e da representatividade desta vitória na opinião pública, saliento que este resultado não me surpreende, não me choca, não me entristece, não me alegra nem me preocupa. Por outro lado também sublinho que não me agrada nem tranquiliza e que nem seria essa a minha opção de voto.

Penso que, em parte, isto se deve ao facto de achar que nem tudo é mau e preocupante no saudosismo. Este está longe de ser um fenómeno de origem colectiva. Pelo contrário, ele parte do indivíduo para o colectivo. Pois é um fenómeno emotivo, passional, parcialmente racional, reacção natural ao envelhecimento e respectivo ressaibo e nostalgia. Por outro lado, a saudade do passado é algo que acaba por ser maravilhosamente paradoxal, pois ela é sentida de modo bem íntimo e introspectivo, contudo - na perspectiva de um místico admirador de Jung como é o meu caso -, ela não é mais que um reflexo do inconsciente colectivo e a sua inerente saudade do Paraíso Perdido e da remota Idade do Ouro.

Não, não estou a delirar. Sei que não é esse o caso da época da Ditadura Nacional, contudo o sentimento saudosista em questão acaba por estar relacionado com este inconsciente colectivo, pois a saudade do antigo regime não é mais que a saudade de algo que em boa parte nunca existiu, pois as lembranças do vivido estão efabuladas pelo presente, desencadeadas pela melancolia nostálgica que este causa e pela tendência inata do sentimento da falta da dita Idade do Ouro.

O lado negativo de tudo isto é que esta tendência do inconsciente colectivo é tanto maior quanto mais opressoras e deprimentes forem as condições do presente. E quando estamos perante uma população nacional envelhecida, isto torna-se ainda mais verdade, por um factor individual muito simples. A maioria da população portuguesa era jovem no tempo da ditadura nacional. A memória da juventude tem sempre um perfume agri-doce. É a memória da nossa plena vitalidade. Pior é o aspecto colectivo que contribui para este sentimento e o agudiza - os nossos deprimentes 33 anos de democracia e tudo de execrável que ela trouxe e desenvolveu. E do muito que se tem agravado. E o pior disto tudo é que grande parte das pessoas não tem consciência de que aquilo que se tornou odioso neste actual regime é em grande parte causado por o país ter vivido tanto tempo em ditadura e refém de territórios que era incapaz de gerir convenientemente e de saber entregar no timing e modo correctos. Ter-se-ia evitado PREC's e respectivos cromos da história nacional, descolonizações feitas à... pressão e um conjunto de partidos cheios de incongruências ideológicas, figuras folclóricas e disputas tristes se não fossem anedóticas.

Mas agora não adianta chorar pelo que podia ser mas não foi, há que encarar aquilo que é. E os tabus, pruridos e preconceitos quando se aborda determinadas personagens e assuntos não ajudam nada e apenas levam a que Salazar continue a ganhar concursos de voto por SMS e Deus queira que não leve a outras vitórias, daquelas que são a sério...

6 comentários:

Áurea disse...

A análise do Pedro sobre o tema, será mais subjectiva e de teor profundamente psicológico, fazendo uma interessante psicanálise e respectiva psicoterapia do colectivo, com pressupostos místicos do indivíduo, que por mais idoso ou jovem e actual que seja, este, traz em si mesmo, uma alma primitiva e repleta de simbolismos ancestrais que o ligam ao passado (O Paraíso perdido) de forma inconsciente, condicionando-o na sua forma de ser e de estar, no presente com repercussões no futuro, manifestando-se em atitudes e acções, do indivíduo para o colectivo - o Surrealismo! Corrente que inspirou o poeta/escritor André Breton e os pintores Salvador Dali, René Magritte, Joan Miró, entre outros.
A minha análise foi apenas objectiva, porém não irei comentar muito mais sobre Salazar, e do que o seu regime trouxe de bom e de muito mau também, para o nosso País. Até porque quando me referi a esta personagem e ao seu regime num comentário anterior, fi-lo de forma isenta, como o faria a Álvaro Cunhal, que ficou em 2º lugar no dito concurso. Para mim estes dois personagens já fazem parte da História, e que tiveram características semelhantes, em pólos diferentes.
Também admiro Carl Jung, e os seus estudos sobra a alma humana e o seu misticismo, psiquiatria, e não só, assim como também gosto de Freud, mas de um ponto de vista diferente, pela abordagem que ele fez do inconsciente através da simbologia dos sonhos e da sexualidade.

Áurea

Pedro disse...

Paula e Rui Lima,

Muito grato pela vossa informação. Gosto muito de cinema, sim. Já por lá passei pelo vosso blogue muito rapidamente e pareceu-me muito bom. Quando lá voltar vou deter-me mais tempo e deixar o meu comentário!

Áurea,

Pois é verdade. Como a minha intenção não era dar nenhuma réplica nem contestar os argumentos da Áurea deixados no seu comentário, pois até me revejo por completo neles, procurei dar uma abordagem diferente da sua. Foi essa a ideia e penso que lhe agradou, n'est ce pas?

Rui Corrêa disse...

Olhe que as vitórias a sério acontecem. Basta que um partido, não interessa qual, tenha maioria parlamentar.
A tentação é grande.

Pedro disse...

Certo, Rui Corrêa, a tentação é realmente grande, mas penso que no espectro partidário actual isso nunca irá verificar-se. Quanto aos outros que na sombra espreitam acredito pouco no sucesso dos cartazes do PNR, pois ainda não há problemas com imigração que o justifiquem, e quanto maior for o alarido mais pontos estão a dar a esses sociopatas.

Ana M. disse...

Também estou convencida de que estaríamos hoje bem melhor se nos tivessem poupado ao Prec de triste memória.
E quanto mais tentativas censórias forem ensaiadas, mais possibilidades tem, não esse senhor do cartaz, que, coitado, não vai longe, mas outro qualquer que poderá vir a colher, um dia, os frutos da continuada estupidez.

Pedro disse...

Pois, Sininho, é pena não podermos viajar no tempo, mas mais pena ainda é não aprendermos com ads lições desse mesmo tempo... passado.