Tomemos o princípio fulcral do liberalismo herculaniano, que constitui como que o leitmotiv à volta do qual se tecem as infinitas variações da sua teoria e praxis política: «absolutamente falando — repare-se no advérbio escolhido por Herculano — o complexo das questões sociais e políticas contém-se na questão da liberdade individual». Dir-se-ia um mero axioma do individualismo burguês, sem nada de original nem relevante. Como o salienta Joel Serrão, «o que singulariza Herculano não é, evidentemente, o facto de ele ter arquitectado a sua personalidade em torno da fundamentalíssima experiência da liberdade — escritores outros seus contemporâneos fizeram o mesmo —, mas em ter levado esta a uma fundura e a uma autenticidade que são bem o timbre da sua grandeza». Timbre, eis a palavra justa, pois é como se o acento tónico, a clave porque se pauta a sua «Voz do Profeta» ressoasse com uma sonoridade própria, numa modulação inconfundível. Dirigindo-se ao seu caro interlocutor «democrata e republicano», Oliveira Martins, é essa voz que ele faz ouvir, não como um som burguesmente prosaico e terreno, mas como um eco divino, elevando-se desde logo do plano político para o religioso, que, trans-historicamente, o transcende: «A liberdade humana sei o que é: uma verdade de consciência, como Deus». E daí decorre, em linha recta, um imperativo categórico, que a liberdade pressupõe: «por ela chego facilmente ao direito absoluto [cá está o adjectivo fatal, de que o advérbio proveio]; por ela sei apreciar as instituições sociais».
2 comentários:
Perder tampo em alfarrabistas? Não é perder tempo, mas ganhar cultura, e muita!
Parabéns pela aquisição de uma obra literária, com uma edição tão antiga e prestigiada!
Livros raros e de edições bem antigas, há-os na Biblioteca Nacional - mas aí, é só para olhar e consultar/ler e não para adquirir. :)
Áurea
Os da biblioteca nacional também eu não poderia nunca adquirir. Por falta de tempo, como diria o outro... :)))
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